Quando o artista plástico Paulo Consentino selecionou as imagens que iam figurar no muro do C.T. Rei Pelé em 2011, não teve duvidas em colocar um time dos primórdios, quiça, a primeira foto do clube na história, uma foto presente no livro “Santos: Um Time Dos Céus” de José Roberto Torero. Mas chamava a atenção de todos as presenças de dois atletas negros em uma época que o futebol era praticado por uma elite constituída por jogadores brancos. Estava ali lançada a campanha para a identificação desses jogadores.
Passado o ano do centenário do clube, 2012, a campanha foi esquecida, exceto para o pesquisador Wesley Miranda, que já em 2013, ao se deparar com a foto do Atlético Santista reascendeu a busca por novas informações, só que agora com base de pesquisa.
Com recursos próprios, ele foi ao clube levar a descoberta, ganhando apoio dos dois pesquisadores do clube, Guilherme Nascimento e Guilherme Guarche. Ambos foram liberados pelo então Gerente de Comunicação Arnaldo Hase a iniciar uma pesquisa no Arquivo Público em São Paulo, juntamente com o Wesley. Não demoraria muito para que Walmir Gonçalves, exímio pesquisador dos primórdios entrasse nesse time montado pontualmente para essa intensa pesquisa.
Identificada a foto do prélio do segundo quadro, no Festival Esportivo em homenagem ao aviador Edu Chaves com vitória do Santos por 5 a 1 sobre o Atlas SC em 1913, chegou-se ao dois personagens; Esmeraldo e Milton.
Esmeraldo já havia atuado no terceiro jogo da história do Santos ao derrotar o Scratch Inglês em 1913 no Campo do Internacional. Milton, chegou em 1913, oriundo do Escolástica Rosa, onde atuava com Simon, Suplicy, Nilo, Aníbal e Oscar Bastos e atuou durante três temporadas no Santos B e depois se transferiu para o Atlético Santista, onde foi capitão da equipe principal. Também foi
campeão Paulista de 1914 pela A. A. São Bento.
Ali se provava que o Santos nasceu liberto de qualquer discriminação, mas a história não para por ai.
O forte nome de Anacleto Ferramenta era presente nos primórdios da história. Mas sua imagem era incerta, e para muitos, durante muitas décadas, era associada erradamente a outro personagem.
Quando se deparou com uma foto de boa qualidade do União (nome fantasia que o Santos usou para disputar o campeonato santista), Wesley Miranda, constatou que Anacleto Ferramenta era negro. O trabalho de Marcelo Lúcio Fernandes na restauração da foto ajudou ainda mais na comprovação, mas foi o atestado de óbito de Anacleto Ferramenta da Silva, trazido por Marcelo, que se provou de vez que o autor do primeiro gol não oficial da história do Santos era de fato negro.
O prélio em questão, uma espécie de “marco zero”, um jogo-treino contra um combinado local, em 1912, em um campo com dimensões menores que a ideal. Anacleto permaneceu no Santos até 1916 e sua temporada de maior destaque foi a de 1915, quando fez sete gols em dezessete jogos. Anacleto começou a carreira no Americano de Santos e fez parte da equipe de remo do Clube Internacional de Regatas de Santos. Transferiu-se para o Rio de Janeiro, onde atuou pelo Andarahy. Após terminar a carreira no futebol carioca, passou a atuar como árbitro.
O meio-campista Jarbas era figura iconograficamente conhecida pelos pesquisadores. Atuando de 1916 a 1921 em 86 jogos marcando 10 gols, teve um grande destaque nos primeiros anos do clube. Mas foi com um oficio, achado no próprio Santos, que Guilherme Nascimento realçou essa importância. Jarbas era um dos símbolos da luta contra o racismo. O meio-campista foi atacado por um adversário na vitória do Santos contra o A.A. Palmeiras da capital por 3 x 0 em 1917, causando a revolta da torcida santista que obrigou o clube enviar um ofício para a APEA, organizadora da competição, exigindo justiça. Em 1918, tornou-se o primeiro negro capitão do Santos.
Tudo isso numa época em que o preconceito era ainda mais presente na sociedade do que hoje. E eles venceram com a bola nos pés!
Por: Assophis – Associação dos Pesquisadores e Historiadores do Santos F.C.